Sem as inevitáveis comparações com um filme que marcou uma geração, a continuação (um tanto desnecessária) consegue provar que tem algo a dizer – em especial graças a boas novas canções e a um avanço tecnológico que diminui a estranheza das expressões faciais dos personagens, presente em seu antecessor.
A sequência, que conta na verdade a história do pai do protagonista de “O Rei Leão”, estreia nesta quinta-feira (19) nos cinemas brasileiros como uma inevitabilidade depois do sucesso estrondoso do anterior, que fez mais de US$ 1,6 bilhão nas bilheterias.
Infelizmente, até pelo óbvio objetivo comercial do projeto, nem mesmo o envolvimento do diretor ganhador do Oscar Barry Jenkins (“Moonlight”) consegue elevá-lo de verdade.
Na verdade, é difícil de encontrar a sensibilidade do cineasta, responsável por um dos melhores filmes dos últimos anos, preso em um roteiro atrapalhado, dividido entre a trama que deveria contar e os personagens que vão vender bonecos para a criançada.
É como se “Mufasa” fosse dois filmes em um, no qual o potencial claro do primeiro nunca é atingido por causa dos receios de executivos que exigem cenas a cada 15 minutos de Timão e de Pumba, dupla que aponta – ela mesma – sua total desconexão com a história.
Assista ao trailer de ‘Mufasa: O Rei Leão’
Ciclo da vida
Apesar de começar como uma sequência quase clássica, com a filha-herdeira dos protagonistas de “O Rei Leão”, “Mufasa” logo revela seu interesse pela história do pai de Simba, o antigo rei assassinado pelo próprio irmão.
Narrado pelo mandril xamânico Rafiki, o filme mostra a infância do personagem título, um filhote perdido que conhece um jovem príncipe e forma com ele um laço fraterno – até que um bando invasor ameaça sua nova família.
A trama é uma boa oportunidade para mostrar novos lados de heróis e vilões e aprofundar suas relações.
Ajudada pelas canções inspiradas e características de Lin-Manuel Miranda (o principal compositor de musicais dos últimos anos, de “Hamilton” a “Moana” e “Encanto”), a narrativa aos poucos mostra seu valor.
Cena de ‘Mufasa: O Rei Leão’ — Foto: Divulgação
Esquecendo os problemas
Uma pena que a história seja constantemente interrompida pelas trapalhadas dos alívios cômicos na linha temporal do “presente”. Tudo bem, Timão e Pumba são favoritos da criançada, mas suas participações evitam um desenvolvimento coeso e castigam o ritmo.
Toda vez que a carismática dupla de jovens leões chega perto demais de explorar de fato um relacionamento minimamente complexo e – com o perdão da palavra – humano, suricato e javali correm para impedir.
As idas e vindas, apenas cansativas no começo, se transformam em uma espécie de tortura psicológica para um público que lá pela metade já aceitou sua inevitabilidade.
Cena de ‘Mufasa: O Rei Leão’ — Foto: Divulgação
Lembre-se de quem você é
No fim, é até difícil determinar a extensão da participação de Jenkins. O diretor entrega alguns de seus closes e belos enquadramentos característicos.
Ajudado pelo avanço tecnológico desde 2019, aliás, ele dá aos protagonistas uma mistura muito mais aceitável entre expressões de sentimentos humanos e o realismo animal.
Seria interessante ver o que o cineasta poderia fazer sem as interrupções constantes e a falta de coragem – provavelmente – dos executivos da Disney.
Talvez alguém ainda tenha noção suficiente para convencê-lo a voltar para um terceiro capítulo – por mais que o público e o cinema tenham mais a ganhar com um novo projeto original de um dos diretores mais talentosos de sua geração.
Cartela resenha crítica g1 — Foto: g1