O seminário é gratuito e acontece no auditório da Pinacoteca a partir das 15h.
- Na primeira mesa, Erick Santos, Leonardo Almeida e Raquel Caminha abordam o tema “Acervos afrodiaspóricos em museus cearenses”, com mediação de Jorge Silvestre.
- A segunda mesa tem o tema “Arquivo na arte contemporânea” e recebe Jaime Lauriano, Davi Pontes e Antônio Wilame Júnior, o jovem èsù, com mediação de Gi Monteiro.
Obra “Mistério do planeta” de Amanda Nunes. — Foto: Divulgação
Mesas debatem afrofuturismo, catalogação de artes em museus e mais
Antônio Wilame Júnior, o jovem èsù, é artista e pesquisador, mestrando no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Humanidades pela UNILAB — Foto: Divulgação
Para o artista e pesquisador Antônio Wilame Júnior, o jovem èsù, o seminário é um importante espaço para discutir a memória negra para além da conservação em museus, pensando também na continuidade dessas heranças culturais.
“Como essa memória negra está dentro dos museus cearenses? Quais os nossos desejos? Quais os desafios para a conservação dessa memória negra? Estarei para debater como o corpo, a matéria, os documentos, os objetos, as lacunas e os esquecimentos são fontes para a produção artística contemporânea. Essa arte contemporânea que é interessada em rearticular a inscrição das histórias avessas”, refletiu para o g1.
Wilame é mestrando no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Humanidades pela UNILAB e pesquisa a memória negra no município de Redenção, a primeira cidade do Brasil a libertar os escravizados.
Ele também é diretor do curta-metragem “REDENÇÃO 2083”, filme que utiliza a estética do afrofuturismo para repensar as representações históricas da cidade, como estátuas, pinturas, etc.
“A abolição em Redenção aconteceu no ano de 1883, um ano antes da abolição estadual e cinco anos antes da abolição nacional. Eu proponho essa viagem no tempo, de ir até o ano de 2083, para repensar esses monumentos a partir do afrofuturismo. O afrofuturismo pensa um futuro a partir de perspectivas africanas – tanto estéticas, como políticas e culturais”, explicou o pesquisador.
Segundo Wilame, há no Ceará uma “narrativa histórica da negação da presença do negro”. E isso também dificulta o reconhecimento da cultura africana como ingrediente importante na construção do estado e do restante do país.
“Como que o primeiro estado a abolir a escravatura do Brasil não possui pessoas negras? Onde estão essas pessoas? O Ceará possui mais de 90 quilombos. Então, não é uma presença ínfima, pequena. É uma presença que ela marca e denota o que é a própria cultura cearense”, pontuou Wilame.
Para o artista, um dos principais desafios para a conservação da memória negra do Ceará surge justamente no local que deveria abraçar essa memória: o museu.
“O museu nesse modelo colonial é um espaço que afasta a juventude, porque é ainda como se fosse aquele lugar antiquado, que você vai ver só coisas do passado. Você está aqui e a arte está ali, não pode ter interação. E quando a gente pensa em arte e cultura negra, a gente fala sobre um espectro de participação, de circularidade, de dinâmica.”.
Outro desafio, também apontado por Wilame, são as políticas de incentivo à cultura. A Lei Paulo Gustavo e a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB) são atualmente os aparatos principais de contribuição e fomento à cultura brasileira. Mas, é preciso ampliar:
“Quando a gente fala de cultura brasileira, é imprescindível a gente falar sobre cultura negra. A gente está falando dessa cultura que molda a cultura brasileira desde o samba, afoxés, terreiros de umbanda e candomblé, os maracatus. E a juventude também faz parte desse espaço”, concluiu Wilame.
Erick Santos é mestre em Conservação pela Universidad Complutense de Madrid – Espanha — Foto: Divulgação
Quem também participa do seminário é Erick Santos, mestre em Conservação pela Universidad Complutense de Madrid (Espanha) e coordenador do núcleo Salvaguarda do acervo do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo. Erick coordenou o Núcleo de Conservação do Acervo da Pinacoteca do Ceará até maio de 2024.
O especialista vai trazer para o evento esse olhar da rotina de catalogação de artes em museus, um passo importante para fortalecer as memórias e reconhecer identidades. Mas que também pode apagar histórias, se feito de maneira incorreta. Ele explica:
“Por exemplo: uma pintura do Museu Afro tinha como título ‘Cabeça de negro’ ou ‘Figura negra’, enquanto que uma pintura em que a pessoa era branca foi retratada como ‘Figura humana’ ou ‘Retrato’. A gente percebe também como a parte da catalogação cooperava para esse racismo. Os museus têm feito hoje essa revisão catalográfica do ponto de vista racial.”
“A partir do momento que você corrige uma documentação de uma obra que vai viver muitos anos – muito mais que a gente – é preservar a identidade também e a história.”, pontuou Erick.
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